sábado, dezembro 22, 2007

Actos de Coragem I

– “Adeus.” – Disse ela sufocando as lágrimas que insistiam em se pronunciar. Tentara esconder as marcas do seu sofrimento, no entanto, sabia que, aquele sim seria o trilho certo. Não o mais simples mas, o certo. Corajosamente olhava rosto a rosto o Homem que a seu lado queria perpétuamente. – “Adeus. Adeus porque não dá. Adeus porque quero viver independentemente deste meu amor. Adeus porque não me deixas respirar e eu preciso de ar. Adeus. Não insistas mais no que recusaste ter. Não me procures em noites frias, em dias alcoolizados; não te lembres de mim: dos meus cabelos, dos meus lábios, do meu sabor, da minha textura, do meu corpo, dos meus seios, do meu sexo, dos meus contornos, dos meus olhos… Apenas não te lembres de mim quando não tens mais nada para fazer. Esquece quem não precisas lembrar assim, eu esquecerei quem não quero amar. Segue o teu destino longe do meu, que eu seguirei o meu tão ou mais longe do teu. Adeus. – ”, disse ela sem recuar em nenhuma palavra e afastou-se milímetro por milímetro, segundo por segundo. Partiu e nem deixou rasto para descargo de consciência. Partiu invisivelmente das mãos que a encarceravam. Um grito sem voz deu-se em redor de todos os cantos do universo mas, ninguém a ouviu senão ela própria. Bastou. E virou costas ao sentimento ascético que a tornara invisível durante anos.

sábado, dezembro 08, 2007

“Tem sido um desassossego, desde o início e nunca me passaria pela cabeça vivê-lo na companhia de qualquer outra pessoa.”


Não vou dizer o meu nome, por enquanto. Digo-vos apenas a minha idade, 56 anos, se é que isso quer dizer alguma coisa. Se falasse sobre mim… diria que me considero alguém que viveu e vive intensamente as horas que me dão todo este ar cansado que recuso a olhar no espelho e a aceitar, porque nada tem a ver comigo. Nem todos somos brindados pelo tempo. Tempo… Tempo… O que é isso comparado com o que sinto no peito? Com esta vontade de percorrer tudo o que ainda não percorri e amar-te intensamente como se fosse o primeiro dia? Recordas-te do primeiro dia? Eu nunca me esquecerei, passe lá o tempo que passar. Não dá. Jamais daria para esquecer o dia em que a minha vida passou a estar deveras completa e cujo tracei por integral o homem que queria ser. Naquele dia em que nos enxergamos por mero acaso (não me lembro a data mas, para quê datas e mais datas, se não foi isso que tornou encantador o encontro do meu ser com o teu?). Foram momentos encaixados em instantes de segundos que se prolongaram entusiasticamente até aos dias de hoje. Pela trama do destino entrelaçamos nossos caminhos e a partir daí nunca mais se separaram. Não imaginar-me-ia a compartilhar o meu leito com outra cara, com outra pele, outros olhos e outras palavras. És tu e sempre foste tu quem eu esperei mesmo não sabendo de inicio se serias tu. Hoje, com esta idade, um jovem ainda, percebo o porquê do medo quando algo bom demais vem ter connosco, vindo do nada, talvez, e nos deixa sem reacção. Medo é o que temos, medo. Medo de sermos felizes não esperando que fosse tão fácil. E tão fácil que foi conhecer-te naquele dia em que pela primeira vez tive o medo de ser feliz, porque sem saber, sabia que serias tu. Se hoje morresse sem te ter tido como minha mulher, sem te ter levado ao altar que uniu celestialmente o que já ninguém separia, sem te ter entregado o anel que possuis no dedo, e não te dissesse o que aproveito para te escrever agora, voltaria do túmulo insatisfeito porque não cumpri, pateticamente, devo dizer, o dever de te fazer minha. Porque sei, que a idade também nos ensina alguma coisa, que enquanto não fosses minha, viverias à deriva no amor, parando de porto em porto sem que finalmente pudesses aportar. E eu no túmulo remexer-me-ia de remorsos, meu amor.